A viagem foi longa, de Trujillo foi quase uma hora e meia entre verde, amarelo, rosas e azuis. A mata é serrada e, por momentos, podia ser qualquer outra floresta do mundo. Vêem-se as serras e as flores, os caminhos dos peregrinos. Tudo é verde, amarelo, branco e roxo.
E chegamos a Guadalupe. Estacionar obriga a alguma calma se não queremos deixar o carro num local proibido, não que não haja muitos mal estacionados, mas diz-nos a experiência que mais vale não arriscar. Entrar no mosteiro também obriga a muita paciência e compreensão, já que encontrámos a entrada vazia e aparentemente é necessário adivinhar onde fica a bilheteira. Já agora fica a dica: é na loja de Recuerdos, à esquerda de quem entra. Aqui parece que a comunicação se torna difícil, apesar de nos darmos bem com o castelhano. A funcionária diz-nos que “la entrada es livre” e a seguir cobra-nos 10€. Aqui livre quer dizer sem guia, por estarmos na semana santa não há visitas guiadas. Não aceitam cartões, aliás, é o primeiro sítio grande onde isto nos acontece e, convenientemente, o cajero onde ela nos manda levantar dinheiro cobra uma taxa de 2€. Logo aqui começa com algum mau humor, mas a fé também tem de se sustentar.
O mosteiro começou a ser construído por ordem de D. Afonso XI, em 1340. O rei D. João I de Castela entregou o espaço aos monges Jerónimos em 1389. Por fora apresenta uma mistura de estilos, notando-se que houve acrescentos ao edifício gótico original. O mosteiro é interessante, com uma hospedaria interior, mas a igreja já existia anteriormente ao mosteiro. Um camponês encontrou a estátua da santa que tinha sido escondida junto ao rio Guadalupe, para a proteger da invasão muçulmana.
Entrámos e somos encaminhados para o claustro mudejar. O claustro não é muito grande, mas é a partir daqui que cada porta dá acesso a uma ala do museu ou à hospedaria. Na hospedaria encontram o Claustro Gótico.
Em cada espaço onde entramos é preciso entregar o bilhete para ser rasgado no espaço correspondente, como se existissem 5 museus em que só podem entrar uma vez. Temos o Museu de Bordados, onde se encontram os trajes dos padres com os seus belos bordados dourados e com pérolas. O Museu de Livros, onde verão os livros escritos à mão, uns com pauta, maiores, e outros mais pequenos, coloridos e vistosos. O Museu de Pintura e Escultura, onde se encontram várias obras que pertencem ao mosteiro. A Sacristia, bastante bonita e trabalhada. E o Relicário e Tesouro, onde o nome se encaixa na perfeição. Jóias e peças de grande valor podem ser vistas aqui.
Terão sempre funcionários à vossa volta a dizer que é proibido tirar fotografias, apesar de estar escrito “evite sacar fotos“. Mais uma vez, não conseguimos atingir o castelhano de Guadalupe. Sabemos que as pessoas cada vez mais tentam furar estas regras, mas foi desconfortável ter sempre alguém atrás de nós a verificar se o Tiago tinha mesmo desligado a máquina. No claustro podem fotografar.
Como não somos católicos desconhecíamos por completo esta parte, mas o ponto alto da visita é o camarim da virgem. O camarim foi construído com o apoio de Maria de Guadalupe de Lencastre e Cadenas, portuguesa. Abre a cada meia hora e nós ficámos à espera para subir. Vem um senhor vestido de frade que abre o portão, explicando que deve existir reverência, silêncio, e que é proibido tirar fotografias. Subimos atrás dele, somos os primeiros da fila, admiramos as escadas, o altar, e, de repente, ele vira o altar e aparece a virgem de Guadalupe, ou a “morenita”, porque é de madeira escura. Saca uma coisa (desculpem-nos, mas não sabemos como se chama), passa um paninho, e diz-nos para beijar a virgem. A Raquel era a primeira da fila e teve que se afastar para deixar passar quem realmente sobe até aqui com este propósito. Então, aquilo é uma romaria para beijar a virgem de Guadalupe. Guadalupe tem fiéis não só em Espanha, mas também em Portugal desde a corte, pois algum dos Jerónimos fundadores eram portugueses. Descemos nas calmas a apreciar paredes e decoração, e a ver a gigante fila dos devotos.
A sala de acesso ao camarim, onde esperámos para subir, deixou-nos muita curiosidade e algum aconchego no meio de tanta rigidez dos funcionários. Encontrámos “Portugal” por toda a parte. Inicialmente não conseguíamos perceber porquê, não havia guias e a falta de simpatia não nos deu vontade de perguntar a nenhum dos funcionários. A internet tem destas coisas e tudo se descobre em cinco minutos de pesquisa. D. Pedro I era devoto de Guadalupe e os seus filhos com Inês de Castro foram aqui sepultados: D. Dinis e D.ª Beatriz. Há duas estátuas suas em posição de oração. Diz-nos a história que muitos portugueses por aqui passaram. D. Afonso V, quando veio conhecer a sua pretendente D.ª Isabel, a católica, que o recusou, D. Manuel II, D. Sebastião e outros. Cristóvão Colombo convenceu aqui os reis de Espanha a financiarem a expedição onde descobriu a América e trouxe aqui, mais tarde, os dois índios que vieram com ele das Américas. Foi na Praça de Santa Maria que foram baptizados.
A entrada na basílica é grátis e é nessa altura que percebemos o motivo por que o camarim só abre de meia em meia hora. A virgem está virada para o altar da basílica. Quando ela é virada para o camarim, na basílica não há estátua da virgem. A igreja não é a mais bonita de toda esta viagem, mas vale a visita.
Preço: 5€ (apenas pagamentos em dinheiro)
Horário: 9:30-13h e 15:30-18:30h.
Marcar hospedagem no mosteiro: pelo booking ou pelo site ou e-mail que consta do bilhete: hospedaria@monasterioguadalupe.com
Vale a pena?
Se o desvio for muito grande diríamos que não vale a pena. A pressão para não tirar fotos, o discurso dos funcionários que ameaçam com as câmaras de vigilância e multas a quem tirar fotos é desnecessária. Sabemos que ser a semana santa acrescenta muita pressão com a preparação dos andores para as procissões, mas fica no ar se o atendimento não será sempre assim. A caminho de Alcántara encontra-se o Mosteiro dos Yuste, ligeiramente mais caro (7€), mas a nosso ver um preço mais justo para o que oferece.
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