ENTRE MOSCATEL E TORTAS DE AZEITÃO (PORTUGAL)

Azeitão fica às portas da Serra da Arrábida e para além das suas divinais tortas é também local de produção de vinho e de moscatel de Setúbal.

Se nos seguem regularmente devem ter percebido que gostamos de comer bem, se for barato tanto melhor, mas não nos importamos de gastar mais quando se justifica. Boa comida pede bom vinho e foi assim que fomos parar a Azeitão num domingo de dia da mãe.

Sempre que vamos às praias da Arrábida passamos por Azeitão. Vemos a Quinta da Bacalhôa, pensamos nas tortas de Azeitão, mas até este dia nunca parámos. Isto até visitarmos o Museu do Oriente, em Lisboa. Confusos? O que tem a Fundação do Oriente a ver com Azeitão? Tudo! Calma, nós explicamos.

O nosso dia começou no Convento da Arrábida, que pertence à Fundação do Oriente. Como a Raquel teve que marcar a visita com antecedência, decidiu organizar o dia todo por lá. Falaremos do Convento com mais pormenor noutro artigo, porque o espaço é mais do que pode parecer à primeira vista, mas fica desde já a dica de uma vista estonteante sobre o mar em plena serra da Arrábida.

Com a manhã planeada, faltava decidir se ficávamos por ali ou se regressaríamos a Lisboa a seguir. Quem quer passar o dia da mãe de pijama em casa? Pois, nem a Raquel, então marcou-se uma visita às caves da José Maria da Fonseca. Quem conhece a rota dos vinhos de Setúbal sabe que há muita escolha, mas nesta pesou o facto de a José Maria da Fonseca produzir vinhos sem álcool, que a Raquel consome agora durante a amamentação.

Convento Nossa Senhora da Arrábida

Foi construído no seculo XVI e desativado aquando da extinção das ordens religiosas em 1834. Nessa altura foi pilhado e vandalizado. Quase 30 anos depois foi adquirido pela Casa de Palmela, que assumindo não conseguir manter o convento nas condições merecidas, o vendeu à Fundação Oriente em 1990. Os 25 hectares de terreno albergam os conventos velho e novo, o Santuário do Bom Jesus e o Jardim. O convento velho, ou seja, as 4 capelas, as celas e o conjunto de guaritas, ficam onde antes era a Ermida da Memória.

O espaço ainda precisa de alguma renovação, não sendo acessível a pessoas de mobilidade reduzida, e mesmo com bebé ao colo é preciso cuidado. Tem muitas escadas. A visita é guiada e vale a pena.

Como visitar:

Marcar visita por e-mail. Há visitas às quartas, sábados e domingos. Chegando ao portão tocam à campainha, dizem que têm visita marcada e entram com o carro.

Preço:

5€, levem dinheiro, há pouca rede na serra.

José Maria da Fonseca

É uma empresa familiar de vinhos, das poucas de grande dimensão que ainda se mantém nos herdeiros. José Maria da Fonseca, nascido em Nelas e bacharel em matemática, vem viver para Vila Nogueira de Azeitão. Em 1834, aos 30 anos abre uma empresa em nome próprio. Hoje, a José Maria da Fonseca é o produtor de vinho de mesa e de moscatel de Setúbal mais antigo do nosso país. A 6ª e a 7ª geração trabalham para manter a tradição, mas ao mesmo tempo inovar com as novas tecnologias. A José Maria da Fonseca (JMF) é das marcas mais famosas pelos seus Periquita, moscatéis (de uva branca e uva roxa) e pelo Torna Viagem, muitas vezes recordado em reportagens.

vinha de moscatel roxo

A marca Moscatel de Setúbal foi criada em 1849. O vinho Periquita surge como marca em 1850, tendo sido premiado pela sua colheita de 1885 em duas feiras (Berlim e Barcelona). Hoje, a empresa familiar tem várias marcas de sucesso e os prémios nacionais e internacionais acumulam-se, destacando-se: JMF, Periquita, Periquita Superyor, Lancers, Terras Altas, BSE, José de Sousa, Hexagon e Moscatel de Setúbal.
Falámos dos vinhos sem álcool que acompanham agora a Raquel, mas antes da marca 0%riginal, a JMF já tinha lançado um Lancers Rosé sem álcool em 2009. Destes recomendamos o branco e o rose, bem frescos. O sabor é semelhante (diz a Raquel, mas o Tiago discorda), mas para um bom apreciador de vinho nunca será a mesma coisa. Estes vinhos surgem de um processo de fermentação muito curto, tendo apenas 0,5% de álcool, não sendo mesmo assim recomendado o consumo na gravidez.

Sobre o moscatel Torna Viagem, este surge no século XIX, altura em que JMF enviava barris à consignação, por exemplo para o Brasil. Estranhamente, os barris quando eram devolvidos, não só não estavam estragados como o vinho moscatel possuía características únicas, tornando-se o equivalente a um vinho fortificado mais antigo. Cria-se assim uma parceria com a Marinha Portuguesa, e o navio escola Sagres passa a levar barris de moscatel nas suas viagens. Aconteceu em 2000, 2007, 2010, 2015, 2017, 2018 e 2020. Já todos sabemos que último foi um ano atípico e o Sagres regressou mais cedo. Os 1.600 litros de moscatel ainda não estão no mercado, mas já se sabe que têm as características esperadas dum Torna Viagem.

Visitámos a Casa Museu após um almoço no Wine Corner, também da JMF. O almoço foi na acolhedora esplanada, mas a sala interior também é interessante. O serviço é cuidado e simpático. Com toda a lógica, os vinhos são bastante acessíveis, tanto em garrafa como ao copo, e os pratos são criados com o intuito de serem partilhados. Sugerimos para um casal dois pratos e entradas, porque as doses não são muito grandes. Nós pedimos o prego do lombo (a carne era excelente) e um tataki de atum. Os pratos mais pedidos são os pregos (de carne ou peixe), o cremoso de cogumelos, os ovos rotos com farinheira e o bacalhau. Para sobremesa pedimos a mousse (acompanha com flor de sal, pimenta rosa, azeite e aguardente) e uma torta de Azeitão. A torta queríamos comer na pastelaria regional Cego, mas fica para uma próxima vez.

A Casa Museu foi a casa da família até aos anos 70, que agora vive na Quinta de Camarate, que não está aberta ao público. É uma casa do século XIX que foi restaurada em 1923. A visita começa com uma explicação sobre a marca, na primeira sala logo após a bilheteira. Ali encontram-se medalhas, fotografias, máquinas, e duas garrafeiras frente a frente, uma representa a monarquia e outra a república. Avançando, é-nos apresentado o moscatel mais viajado da companhia, o Torna Viagem. Saímos do edifício e no jardim vemos as vinhas. A guia Tânia explica-nos pela primeira vez o que é o Moscatel Roxo: vinhas com uvas mais escuras e que fazem um moscatel mais doce. Atravessamos um jardim de bambu que nos remete para a Ásia e chegamos às adegas. Na Adega da Mata encontra-se quase todo o Periquita da JMF. Aprendemos sobre os estágios em carvalho ou mogno. Avançamos para a Catedral do Moscatel, ou a Adega dos Teares Velhos. Assim que entrámos a Raquel achou logo que estava a entrar numa catedral. A música era erudita, em homenagem aos monges que fizeram o primeiro vinho fortificado, uma janela tinha uma espécie de vitral, e havia uma atmosfera mística. Ao fundo desta adega encontra-se a coleção particular da família, com moscatéis com mais de 100 anos. Aprendemos que o moscatel nunca se estraga, deve ser engarrafado até aos 150 anos de barril, para não evaporar em demasia, mas pode ser sempre consumido. Não estranhem as teias de aranha, há todo um ecossistema na adega. As aranhas comem a filoxera, os ratos comem as aranhas e os gatos comem os ratos. A visita termina com uma prova de vinhos.

A José Maria da Fonseca não tem só a Casa Museu de Azeitão, mas também a Adega José de Sousa, em Reguengos de Monsaraz, onde se produz o vinho como faziam os romanos.

Como visitar:

Reservámos por e-mail a partir da página oficial da José Maria da Fonseca. Foram muito prestáveis enviando todas as informações necessárias, como tipos de provas e preçários. É necessário indicar o nome, número de visitantes, nacionalidade, língua, data e hora pretendidas para a visita.

As visitas:

Sem prova: 5€

Com prova: de 7 a 30€, depende do vinho escolhido e da quantidade

Há prova premium gastronómica por 47€, com caldo verde, pão, queijos, enchidos e doçaria regional.

prova de vinho José maria da Fonseca Azeitão

Pastelaria Regional Cego

Fica na mesma rua que a Casa Museu José Maria da Fonseca (Rua José Augusto Coelho) e, tal como a casa de vinhos, tem uma história centenária. Manuel Rodrigues, cego, fundou a casa em 1901. A esposa, Teresa Prata, criou os doces emblemáticos da casa através de receitas de doces conventuais. Em 1975, Augusto Pinto, do ramo da hotelaria, ficou com a pastelaria.

São famosos os memés, os esses de Azeitão, os amores, as tranças, os mimos e as tortas de Azeitão. Nós conhecemos a casa através do The Wine Show e ficámos curiosos. A casa mantém um ar rústico.

Preços:

De 0,90€ a 1,30€.

pastelaria cego Azeitão

Do outro lado da estrada encontra-se a Igreja de São Lourenço, bastante simples por fora. É uma igreja do século XVI que foi sendo alterada, principalmente após o terramoto, como tantas na região. No interior há painéis do século XVI, do século XVII e do século XVIII. O mármore do altar é da serra da Arrábida e o retábulo em talha dourada. A igreja foi construída sobre outra, do século XIV.

Os antigos lavadouros, cujo portão fica junto à igreja, são agora um café. Há vários espaços que vendem tortas junto à Praça.

Palácio dos Duques de Aveiro: o primeiro Duque de Aveiro construiu o palácio em terrenos que lhe foram dados pelos frades do Convento de São Domingos. O convento foi todo destruído em 1755, mas ainda se vê a entrada. O Duque de Aveiro foi preso neste palácio, por participação no atentado do rei D. José I. Após a prisão, o palácio foi saqueado e, mais tarde, tornou-se na primeira fábrica de chitas de Portugal, de 1755 a 1846. Hoje está muito degradado, mas não deixa de ser um edifício importante do renascimento clássico.

Há várias fontes importantes na vila: a fonte dos Oleiros, a dos Pasmados e a da Aldeia Rica. A da Aldeia Rica tem um painel que se pensa que fazia parte do Palácio dos Aveiro. A dos Pasmados é do século XVIII, do estilo de Carlos Mardel. Reza a lenda que quem beber esta água ficará ligado a Azeitão. A dos Oleiros tem duas figuras em fardamento militar.

Museu Sebastião da Gama: inaugurado em 1999, este museu dedica-se ao “poeta da Arrábida”. Há também a Casa-Memória Joana Luísa e Sebastião da Gama, inaugurada em 2021, na casa que pertenceu à viúva. Na Praça da República fica uma estátua do poeta. A da fotografia fica na Arrábida.

Quinta da Bacalhoa: teve vários nomes, mas foi no século XVII, quando passa para as mãos de D.ª Maria Mendonça, casada com o “Bacalhau” (D. Jerónimo Manuel) que entra o nome atual. A quinta começou por ser um pavilhão de caça do Infante D. João (1427), mas a sua filha mandou construir um palácio. Os seus azulejos tornaram-na na quinta mais famosa da região. Bem, os azulejos e o atual proprietário, o Joe Berardo.

Forte da Arrábida: após a Restauração era preciso proteger a costa e o convento, então nasce o forte, em 1676. Hoje alberga o Museu Oceanográfico e um Centro de Biologia Marinha.

Miradouro do Portinho da Arrábida: das melhores vistas sobre Troia e a serra da Arrábida. Se apanharem céu limpo não vêem só Troia mas muito mais além. É na antiga plataforma para parapente que se tiram as fotos em queda sobre a Arrábida.

arrábida, azeitão

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