Não falamos aqui de religião, mas talvez já tenhamos referido que não somos católicos. Não ser católico não invalida que o turismo religioso nos cative. Gostamos de ver a arquitetura das igrejas, ver o seu interior trabalhado, o simbolismo, ouvir um organista tocar órgão de tubos, ver as romarias e festas ao santo padroeiro. Fátima não é diferente, nunca nos verão ali como peregrinos ou a pagar promessas, mas como turistas sim.
Porquê Fátima? Como também já vamos dizendo ocasionalmente, a Raquel é profissional de saúde. A câmara de Ourém e o Fátima Hotels Group decidiram criar uma campanha para profissionais de saúde durante a pandemia. O grupo de hotéis oferecia uma noite sem pequeno-almoço (e sem extras, como berço) e a câmara oferecia uma segunda noite com pequeno-almoço, mais um voucher para usar num restaurante. Decidimos ir e escolhemos um fim de semana de novembro. Este ano a campanha foi renovada e voltámos a ir em abril.
Fátima é nitidamente uma cidade criada em torno do fenómeno religioso. O que quer isto dizer? Transpira devoção religiosa por todos os poros e tem uma grande importância, não só para a igreja católica, mas para todo o país. Mexe com a economia nacional, com os peregrinos e as suas anuais idas a Fátima a pé, e atrai visitantes de todo o mundo a Portugal. Como exemplo, em Nova Iorque, a senhora que nos tratou do processo em que as nossas malas ficaram perdidas, disse-nos logo que queria ir a Portugal por causa de Fátima. Claro que ajuda o Papa João Paulo II ter vindo três vezes a Fátima e ter beatificado os irmãos Jacinta e Francisco.
Como começou?
Portugal rural, pobre, em plena primeira guerra mundial. Não é obrigatório ir à escola, as crianças trabalham para ajudar os pais, geralmente na pastorícia. Lúcia e os primos Francisco e Jacinta não são exceção. Levam os rebanhos para o campo em vez de estarem na escola a aprender a ler e a escrever. Em 1917, a 13 de maio, as três crianças vêem uma figura muito brilhante que identificam como Maria, em cima de uma azinheira. A mãe de Jesus, segundo eles, tem uma mensagem. Durante os seguintes cinco meses, sempre ao dia 13 e ao meio-dia, os três pastorinhos devem voltar à Cova da Iria para se voltarem a encontrar. Lúcia ouve, vê e fala com Maria, Jacinta ouve e vê a aparição, e Francisco só vê, nunca ouve. Dizemos sempre ao dia 13, mas em agosto foi no dia 19, e em Valinhos, porque os pastorinhos tinham sido levados para Vila Nova de Ourém. Estava-se a criar um fenómeno em torno das suas partilhas e o Administrador do Conselho quis tentar controlar a especulação. A 13 de outubro 50.000 pessoas testemunham a aparição e outro fenómeno, que foi chamado o milagre do sol.
Cessou a chuva, e o céu, até ali escuro, (…) aclarou um pouco, o que fez que quase todos os olhares instintivamente fitassem o mesmo local. (…) Apareceu um globo, prateado, fazendo um pequeno giro e aparecendo atravessado aqui e além pelas nuvens! Isto por 3 vezes, com intervalo, talvez, de 3 a 4 minutos
Maria José de Lemos Queirós
Vamos resumir a história, fez-se uma capelinha junto à azinheira em 1919, a Capelinha das Aparições, que fica no local do atual santuário. Lúcia de Jesus, Francisco e Jacinta Marta (10, 9 e 7 anos) não foram logo reconhecidos como videntes, passaram primeiro pela fase de serem considerados, não diríamos mentirosos, mas umas crianças com imaginação fértil. Revelam que Maria lhes disse que iriam morrer pouco depois do fim da guerra. Francisco morre em 1919 e a irmã no ano seguinte. Os irmãos morrem de gripe espanhola que assola o nosso país após o final da guerra. Tal como se fez agora com a Covid-19, Ricardo Jorge manda fechar escolas, proíbe festas e romarias, e requisita edifícios públicos para se transformarem em enfermarias. Os anos passam e Lúcia vai para um convento e escreve vários livros, morrendo apenas em 2005. Fátima cresce como centro de peregrinação e tornam-se habituais as idas a Fátima a pé. Os dias mais importantes são o 13 de maio, o 13 de agosto (para os emigrantes) e o 13 de outubro.
A imagem de Maria que se venera na capelinha foi oferecida por Gilberto Santos em 1920 e é do escultor José Ferreira Thedim. A primeira missa na capelinha foi a 13 de outubro de 1921. A 6 de março de 1922 foi destruída com dinamite, mas é reconstruída e inaugurada a 13 de janeiro de 1923.
A 13 de maio de 1928 lança-se a primeira pedra da Basílica nossa senhora do Rosário. Em 1946, a escultura da capelinha é solenemente coroada, tendo a basílica sido concluída em 1953.
Falando em coroa, a que se coloca na imagem em dias solenes pesa 1200 gramas, tem 2679 pedras preciosas e 313 pérolas. Desde 1989 tem encastrada a bala que João Paulo II ofereceu, em 1984, ao santuário. A bala é a do atentado que sofreu em 1981. A coroa foi feita com ouro oferecido por mulheres que queriam agradecer pelo facto de Portugal não ter entrado na Segunda Guerra Mundial. É uma bela peça de arte que tivemos a sorte de ver exposta, uma vez que faz parte habitualmente da exposição permanente Fátima Luz e Paz, no edifício da reitoria.
O museu do santuário de Fátima abriu em 1955. Em 1982 é inaugurado o alpendre para receber o Papa João Paulo II nas celebrações do 13 de maio, e em 2007 é inaugurada a Basílica da Santíssima Trindade, onde cabem 9000 pessoas sentadas.
O Santuário
O Santuário é constituído por diferentes edifícios. A Basílica nossa senhora do Rosário é obra do arquiteto neerlandês Gerardus Samuel Van Krieken, foi construída com material nacional, desde a pedra mármore aos sinos. Percebeu-se logo que era demasiado pequena, a devoção era grande e atraía cada vez mais peregrinos. Vale a pena entrar para visitar o espaço, onde se destacam os túmulos com os restos mortais dos irmãos.
De frente para a Basílica encontra-se, à esquerda, a azinheira e a Capela das Aparições. Junto à capela existe a zona onde os devotos queimam velas, um poço com o Fontanário e o Monumento de Sagrado Coração de Jesus (1932) e o percurso que os peregrinos fazem de joelhos (para pagar promessas). O sistema das velas funciona com serviço de honestidade. São vocês que depositam o valor das velas. À direita quem está de frente para a Basílica existe um pedaço do muro de Berlim. A 9 de novembro de 1989 foi derrubado o muro de Berlim, construído em 1961 para separar a parte Ocidental da Oriental. O fragmento que está no santuário foi doado por um emigrante português e faz parte de um monumento inaugurado em 1994. Virgílio Casimiro contactou Luciano Guerra (reitor do Santuário de Fátima em 1991), para doar um fragmento do Muro de Berlim que tinha adquirido com outros portugueses, residentes na Alemanha.
A mais recente Basílica Santíssima Trindade é uma obra de Alexandros Tombazis, arquiteto grego. É um impressionante edifício circular com 13 portas, a principal dedicada a Jesus Cristo e as seguintes aos apóstolos. No interior existe um painel dourado de Ivan Rupnik. É um edifício que segue uma linha de arquitetura contemporânea, diferente da Basílica nossa senhora do Rosário, construída num estilo neobarroco.
Por baixo da basílica existem capelas e uma sala de exposições temporárias. Vimos aqui a coroa, o que já explicámos que foi um grande golpe de sorte. Junto à moderna basílica existe a Cruz Alta. À noite, a torre sineira da Basílica nossa senhora do Rosário é iluminada e o Santuário ganha outra vida com a procissão das velas. É possível saberem se há procissão na página oficial do Santuário de Fátima.
Sabiam que há treze estátuas da nossa senhora de Fátima peregrinas? Agora, com a guerra da Ucrânia, voltou a falar-se nelas. São imagens de Maria que viajam pelo mundo.
O Vaticano reconhece Fátima como um lugar de peregrinações, tanto que todos o papas mais recentes visitaram o santuário.
É possível fazer visitas guiadas ao Santuário. A nossa estava incluída no alojamento, pagámos só os auriculares (2€) – nem seria preciso se tivéssemos os nossos. Foi feita com a Raízes de Fátima e a guia Eliana. Foi muito interessante e a Eliana é descendente dos pastorinhos Jacinta e Francisco. As visitas acontecem de segunda a sexta, das 10h ao meio-dia. Aos sábados e domingo, das 9:30h às 11:30h, e aos dias 13, de maio a outubro, de tarde, a partir das 14h.
Outros locais de interesse
Os mais devotos podem também visitar outros locais, como a via sacra, em Valinhos, onde ocorreu a aparição de agosto, o calvário húngaro, a loca do anjo, o monumento aos pastorinhos e ao peregrino, e a igreja de Fátima onde os pastorinhos foram batizados. A via sacra inicia-se na rotunda do monumento aos pastorinhos (em direção da A1) e termina em Valinhos. Em Aljustrel é possível visitar a casa dos pastorinhos.
Museu Milagre de Fátima: é um museu interativo que leva o visitante até às aparições de Fátima. São 40 minutos a experienciar tudo o que já aconteceu ali.
Museu de Cera: mais um espaço onde se replicam os acontecimentos da cidade. São 32 cenas e 120 figuras de cera. O bilhete custa 7,95€ (4,90€ para crianças dos 6 aos 17 anos, 6,70€ para maiores de 65 anos).
Museu Santuário de Fátima: o museu foi fundado em 1955. Alberga as exposições permanentes do Museu-Fátima Luz e Paz e Casa-Museu de Aljustrel. A Casa-Museu de Aljustrel representa como se vivia na época. A exposição Fátima Luz e Paz tem os artefactos mais importantes para o Santuário, como a coroa, e fica no edifício da Reitoria do Santuário. Junto à reitoria também encontram uma escultura de José Aurélio que representa o presépio (não nos lembramos de ter visto), inaugurada em 1999.
Museu de Arte Sacra e Etnologia de Fátima: expõe uma alargada coleção de imagens de Jesus menino, da paixão de Cristo, de presépios e de crucifixos. Existe uma sala dedica ao trabalho missionário e outra aos pastorinhos.
Casa de Francisco e Jacinta Marta e casa de Lúcia: ambas ficam em Aljustrel, de onde as crianças eram naturais. A casa de Lúcia foi doada por ela e a dos irmãos Marta foi comprada pelo Santuário e reconstruída. Faz sentido para devotos que queiram conhecer mais sobre a vida dos pastorinhos.
Monumento Natural das Pegadas dos Dinossáurios: pertinho de Fátima e fora do campo religioso encontram um campo fóssil com pegadas de dinossauro.
Onde ficar
Claro que vamos sugerir o Fátima Hotels Group, não só porque usufruímos da estadia de forma gratuita, mas também porque são hotéis muito centrais. O grupo dispõe de 10 hotéis, nem todos são à porta do santuário. Nós ficámos no hotel Regina da primeira vez e no Hotel Estrela de Fátima da segunda vez. Gostámos mais deste último, com uma renovação mais recente, apesar de ser original de 1958.
Destaca-se na mesma rua o Hotel Mercure Fatima. Jantámos lá e gostámos, destacando a decoração do bar.
Onde comer
Restaurante Manhãs: recomendado, mas não estava aberto durante a nossa estadia.
Casa Plátano: fica dentro do Mercure. Estava fechado, mas era umas nossas hipóteses.
365 dias no mundo estiveram em Fátima em novembro de 2021 e abril de 2022
2 respostas
Dos hoteis que voce sugere, qual fica mais perto da entrada do santuario. Viajosmo com idoso com dificuldade de loconoção e queremos o que precisara andar mais. Pois faz questão de ir andando. Grata
Penso que a maioria dos hotéis do grupo são na mesma rua e o santuário fica do outro lado. Sugiro o Hotel Estrela de Fátima.