Falar do Sri Lanka é falar de chá do Ceilão. O Sri Lanka é o quarto país na produção de chá, o pódio pertence à China, Índia e Quénia, mas o maior exportador é a ilha cingalesa. E quem introduziu o chá no país? Teremos sido nós? Não. Quer dizer, mais ou menos. Como assim? Nós explicamos: os portugueses trouxeram o chá da China para Portugal e na corte ficou o hábito de beber o chá nas mais finas porcelanas chinesas que também trazíamos.
Catarina de Bragança, filha de D. João IV, casa com D. Carlos II da Inglaterra em 1662. Este casamento caiu muito bem na corte inglesa porque Catarina levava um espetacular dote: Tanger, Mumbai, dinheiro, temperos e outros tesouros. Agora, a partir daqui será tudo verdade ou uma espécie de mito urbano? A Rainha de Inglaterra, Escócia e Irlanda chegou por via marítima muito enjoada. Terá pedido um chá, mas desconhecendo o que era, ofereceram-lhe cerveja.
Catarina levava consigo chá e serviços de porcelana da China, pois a aristocracia portuguesa bebia chá há mais de 150 anos. A verdade é que Catarina bebia chá como um ritual diário e a restante corte inglesa quis imitá-la. As famílias reais eram o que hoje em dia chamamos de influencers, ditavam modas. No entanto, o chá já existia na Inglaterra, só que era extremamente caro e utilizado mais como mezinha. Chegou às lojas de Londres em 1657, através de Thomas Garway que vendia a folha e a infusão em Exchange Alley. Aos poucos, o hábito de beber chá foi-se instalando e hoje parece um hábito mais inglês do que português, havendo o chamado chá da tarde que se serve entre as 16 e 17h. O Afternoon Tea tornou-se numa refeição leve que se serve entre o almoço e jantar, provavelmente introduzido em 1840 pela Duquesa de Bedford.
A Camellia sinensis, planta do chá, chegou à ilha em 1824 para ser plantado nos Jardins Botânicos Reais em Peradeniya (Kandy), não para fins comerciais, mas para completar os jardins. Era habitual na época plantar toda a espécie de plantas trazidas de rotas comerciais em jardins botânicos, nós também o fazíamos, como podemos ver na Mata do Buçaco, Jardins do Palácio da Pena, Jardim Tropical, etc. Este jardim é de 1821 e tem mais de 4000 espécies. A sua coleção de orquídeas é uma das razões das visitas, só os estrangeiros pagam bilhete (3000 Rupias).
James Taylor chegou ao Ceilão britânico em 1852, e em 1860 dirigia uma plantação de café em Loolecondera (Kandy). Uma peste dizimou os campos de café, que foram substituídos por chá com grande sucesso. Abriu uma fábrica de chá em 1872 e em 1873 chegou a Londres a primeira remessa cultivada de chá de Ceilão, 10kg. Sir Thomas Lipton visitou Taylor no Ceilão em 1890, interessado em fazer negócios, tendo acabado por abrir uma casa de chá em Inglaterra. Sim, falamos do Sr Lipton dos chás homónimos. Durante um século a sua qualidade aumentou com criteriosos métodos de proteção, tendo o país se tornado o maior produtor de chá em 1965.
Em 1971-72 todas as empresas de produção de chá foram nacionalizadas, sendo reprivatizadas apenas 20 anos depois. Em 1982 começou a produção de chá verde. Em 1999 decidiu-se que o leão simbolizava o chá de Ceilão puro, símbolo que o representa até hoje. Em 2001 abriu o Museu do Chá de Ceilão em Kandy e a associação de chá do Sri Lanka foi criada um ano depois. Em 2011 tornou-se reconhecida como a única zona autorizada a produzir chá de Ceilão. O Sri Lanka é o único produtor de chá livre de ozono no mundo.
Produz-se principalmente chá preto, mas também verde e branco. O chá é produzido em 7 regiões:
- Sabaragamuwa (Low-grown), que inclui Ratnapura
- Ruhuna (Low-grown) que inclui Galle
- Kandy (Mid-grown)
- Uda Pussellawa (Mid-grown a High-grown)
- Nuwara Eliya (High-grown)
- Uva (High-grown)
- Dimbula (High-grown)
Só as mulheres apanham as folhas, que precisam de estar num estado preciso de crescimento. O argumento é de que a delicadeza das suas mãos vai fazer a colheita com o cuidado essencial para não se perder qualidade. Um trabalho duro, com os cestos às suas costas a pesarem quando cheios cerca de 20kg. Uma jornada diária básica enche um cesto, recebendo as funcionárias um prémio extra quando ultrapassam este valor, sendo habitual chegarem aos 30kg. A senhora que vêem na fotografia abaixo já completou 70 anos e continua a trabalhar diariamente na apanha.
Os vários tipos de chá (pretos, verdes, brancos, etc.) são obtidos a partir da mesma planta, Camellia sinensis, variando apenas no processo de oxidação e tratamento que as folhas sofrem na produção. Quanto mais finas forem as partículas mais intenso será potencialmente o chá ao nível de cafeína porque se liberta mais rapidamente durante a infusão. As variedades mais caras usam folhas inteiras ou fragmentadas grandes, que mantêm mais aroma e complexidade de sabor. Esses chás, menos moídos, liberam compostos lentamente e são considerados de qualidade superior.
Nós visitámos a plantação da Halpé Tea Factory e fizemos um tour. Esta plantação fica em Uva, região de plantação em altitude. Um guia explica como se faz a plantação, colheita e o processo em fábrica. É possível experimentar e ver as funcionárias a colher as folhas de chá manualmente e transportá-las em cestos, terminando com uma prova de chá de 5 tipos. A fábrica tem loja.
Podem fazer um tour parecido com o nosso noutras plantações, reservando por exemplo com a Get your Guide o tour Colheita de Chá e fábrica.
O chá – da colheita ao embalamento
A colheita é feita de forma manual e só são colhidos botões com quatro folhas. As folhas chegam em cestos à fabrica para secar e murchar. Não faz lembrar a vindima?
As folhas secas vão para uma máquina para quebrar, onde a essência se liberta.
Depois passam por um processo térmico de quente e frio, numa malha vibratória para separar por tamanho e, por fim, o produto é separado, pesado e embalado.
Estima-se que se produzam 328 mil quilos por ano, 80% para exportação.
Como beber o chá perfeito
- Uma colher de chá de Ceilão
- Água acabada de ferver
- 3-5 minutos de infusão
- Coar e
- Servir
Encontrámos diversas receitas com chá, da Pure Ceylon Tea. Testem e digam-nos o que acharam.
Trilho de Sir Thomas Lipton
Entrando pela Fábrica de Chá Dambatenne começa o trilho de 8 km que sobe até 2000 metros acima do mar. Demora de 3 a 5 horas a percorrer. No topo do miradouro encontram o banco de Sir Thomas Lipton. O local algo humilde tem só uma pequena placa de madeira dizendo “Lipton’s seat” e uma escultura de Sir Lipton sentado a beber chá. A beber já não, pois a chávena já desapareceu. Fazer este trilho faz parte da estadia luxuosa no hotel Thotalagala, onde Lipton ficou alojado. Hóspedes também podem visitar a sua residência.
Lipton pode ter começado o negócio do chá como parceiro de Taylor, mas terá mais tarde investido ele próprio em plantações e fábricas para alimentar o seu sonho de democratizar o acto de beber chá. Tudo começou ao embalar o chá em pequenas porções standard, a percursora do Yellow Label Tea.
Sugere-se que subam até às 7 da manhã, para verem o nascer do sol nas montanhas de Ella. Podem reservar o tour de meio dia para subir ao miradouro e visitar a fábrica de chá. Podem subir de tuk tuk por cerca de 3000 rúpias, demora 45 minutos. A entrada custa 500 rúpias e 100 por cada tuk tuk, pagos em dinheiro a 1km do destino.
Curiosidades
- O chá não é o único produto cingalês valorizado no exterior. Temos um trio de chá, canela e safira. A Gorreana, produtora de chá dos Açores, teve uma versão de chá verde Hysson com Ananás da ilha de São Miguel e canela de Ceilão.
- A produção é ética. Funcionários recebem casa e cuidados médicos.
- 5% da população dedica-se à indústria.
- Foi o chá oficial dos jogos olímpicos de Moscovo e da Expo 88, na Austrália.
- O Museu do Chá de Ceilão custa 1000 rupias a não residentes.
- Lemos que deve ser bebido em pé.
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365 dias no mundo estiveram no Sri Lanka de 29 de outubro a 7 de novembro a convite do Turismo do Sri Lanka
8 respostas
Aprendi mais sobre chá no teu post que na plantação. 😉👏🏼👏🏼👏🏼
Jura? 😂😂😂
Eu estou apaixonada pelas fotos! Ficaram lindas!
Comecei a apreciar chás recentemente, sempre fui team café.
Obrigada. Os chás são muito bons. Trouxemos alguns.
Que interessante a história do chá, nunca imaginaria que foram os portugueses os responsáveis pelo hábito britânico de tomar chá. Gostei também de saber todos esses detalhes sobre o chá de Ceilão, deve ser muito curioso ver e participar da colheita.
Há também o boato que Catarina levou o hábito de comer com os talheres para a Inglaterra. lol!
Eu amo chás, tomos todos os dia praticamente, comecei com esse estilo britânico, mas quando fui a China descobri que eles já tomavam há muito mais tempo rs, os caras entendem bem de chá. Não conhecia esse chá do Ceilão.
É um chá preto forte, mas muito saboroso.