A Lousã tem uma história caricata que queremos partilhar e se passou no edifício do hotel onde ficámos. Temos algumas dúvidas que seja totalmente verídica e de que não haja um pouco de floreado (mito urbano) em torno dela. Vamos a ela?
Sabemos que as tropas francesas estavam à grande e à francesa em território português. A família real tinha-se mudado para o Brasil deixando o país à mercê da chegada das tropas napoleónicas sob comando do General Junot, em 1807. Esta fuga apressada levando tudo o que podiam e até grande parte da corte com eles mudaria a história dos dois países, deixando o reino de Portugal em desgraça, desespero, fome e parado no tempo durante longos anos. É graças a esta estadia forçada que D. Pedro decide, anos depois, declarar a independência do Brasil.
Corria o ano de 1811, terceira invasão, e as tropas francesas já batiam em retirada após serem travadas pela defesa das Linhas Torres. Abandonavam lentamente, pilhando e tomando o que encontravam pela estrada real, o que colocou a Lousã no caminho. O objetivo era chegar ao país vizinho já que não conseguiam avançar. Ganhar fundos (melhor dizendo, pilhar) levava tempo, era preciso entrar nos edifícios, escolher o que interessava e destruir casas, igrejas, celeiros, o que houvesse. É assim que desaparece a prata da Igreja Matriz da Lousã. Os ingleses, como bons aliados acabaram por prestar apoio nas batalhas. As tropas francesas e as inglesas entraram em confronto na ponte de Foz de Arouce e isso mudou TUDO. Perderam-se várias vidas nas duas tropas, esta parte documentada.
No centro da Lousã temos o Palácio da Viscondessa de Espinhal ou dos Salazares. Foi neste palácio que se instalou o comandante das tropas francesas. Numa noite, para ele, como todas as outras, sentou-se à mesa a imaginar que iria saborear uma bela refeição, só que os ingleses tinham outros planos. O Marechal Masséna não sabia que as suas tropas, comandadas pelo Marechal Rey tinham sido atacadas na noite de 15 de março e que tinham fugido pela ponte medieval, explodindo-a após a sua passagem. Quando recebe a notícia da derrota na Batalha de Foz de Arouce, Masséna abandona apressadamente a mesa farta e o palácio. Conta-se que o Duque de Wellington entra na Lousã triunfalmente, toma o Palácio e se senta à mesa jantando com prazer as iguarias deixadas pelo opositor. Verdade ou não, esta parte dá uma bela estória para quem visita o Palácio da Lousã, que se tornaria o primeiro boutique hotel do país.
A Lousã teve tempos áureos, graças a Viscondessa, benemérita da vila. O hospital de S. João abriu em 1888, o comboio chegou à Lousã em 1906 e a energia elétrica em 1924. Hoje, a linha de comboio já desmantelada recebe o metrobus, uma via dedicada por onde circulam autocarros elétricos unindo Serpins a Coimbra.
A Lousã é mais do que a história da vila, é a porta para as aldeias de xisto, para a serra, praias fluviais e muito mais. Situada numa zona de transição urbana e rural, a Lousã leva-nos até à calma e natureza, mas sempre próxima da malha urbana.
O que visitar
Castelo de Arouce: foi documentado pela primeira vez em 1087. Este castelo foi uma importante linha de defesa de Coimbra. Foi renovado em 2019, altura em que também foi inaugurado o Centro de Interpretação e Acolhimento. Abre de sexta-feira a domingo e feriados das 9:30 às 17:30 com paragem para almoço das 12:30 às 14h. Tem um bom estacionamento.
Centro Histórico:
- Pelourinho: foi reconstruído graças a documentos reunidos por Álvaro Viana de Lemos, e encontra-se atrás dos Paços de Concelho.
- Paços de Concelho: construído entre 1930 e 34 com projeto de Joao Moura Coutinho. Tem painéis de azulejo e telas de importância histórica.
- Igreja Matriz: tem um altar de talha dourada. No dia em que quisemos visitar estava a decorrer a missa dum funeral.
- Capela da Misericórdia: fica junto ao Palácio da Lousã e sobressai por uma beleza simples. É de 1568.
- Museu Etnográfico Dr Louzã Henriques: o museu tem o acervo particular do Dr Louzã e da câmara municipal sobre o mundo rural. Reabriu em 2020. Abre de terça a sábado das 9 às 17:30 e ao domingo só até às 13h.
- Museu Municipal Prof. Álvaro Viana de Lemos: está integrado no Ecomuseu da Lousã. Também fica aqui o Welcome Center das Aldeias Do Xisto. O investigador Álvaro Viana de Lemos dá o nome ao museu que fundou com o espólio do Padre Joaquim José dos Santos e outras doações. O edificio é de 1901, e foi adaptado para o efeito. Abre de terça a domingo, das 9 às 17:30.
- Palácio dos Salazares (ou Viscondessa de Espinhal): foi mandado construir pelo pai da Viscondessa, Bernardo Salazar Sarmento d’Eça e Alarcão. Foi durante este tempo tomado pelas tropas francesas, sendo a casa do Marechal Masséna. Em 2005 foi convertido em hotel, como Palácio da Lousã Boutique Hotel, mais tarde do Grupo Melia e hoje Octant. Preserva quatro salas de estar (Sala do Brasão, Sala do Piano, Sala João Antunes ou na Sala do Oratório) onde os hospedes se podem sentar a relaxar. A Viscondessa tinha de nome Maria da Piedade de Mello Sampaio Salazar e recebeu o título nobre pelas mãos de D. Luis I pelos seus feitos beneméritos na Lousã.
Isto é Lousã: o projeto foi criado introduzindo baloiços em paisagens naturais, um na Serra e um na praia fluvial. Não sabemos se foram os primeiros baloiços a surgir, mas foram dos primeiros.
- Baloiço de Trevim: fica no ponto mais alto da Serra da Lousã a 1200 metros de altitude.
- Baloiço da Senhora da Piedade: não estava na nossa segunda visita porque é retirado regularmente por questões de segurança.
Praias fluviais: há várias praias e merecem a visita no verão.
- Senhora da Piedade: a praia fica abaixo do castelo, o acesso deve ser pedonal porque não tem muitos lugares de estacionamento. A praia recebe a água da ribeira de São João, tem um café, balneários e zona de piquenique.
- Senhora da Graça: fica à entrada de Serpins e dispõe duma área relvada com infraestrutura junto ao rio Ceira.
- Bogueira: também fica no rio Ceira, mas no Casal de Ermio. É praia acessível e um passadiço leva os visitantes até à zona relvada. Tem infraestruturas.
Ermidas de Nossa Senhora da Piedade: o santuário tem 4 capelas, de São João, a da Agonia, a de Nossa Senhoria da Piedade e a Senhor dos Aflitos. Vêem-se do castelo e dão uma bela imagem envolvidas pelo verde da serra.
Cabril do Ceira: é um canhão pouco conhecido na freguesia de Serpins que não tivemos tempo de ir conhecer, mas dizem ser muito bonito.
Obelisco da Batalha da Foz do Arouce: é de 1811 e erigido em memória dos que perderam a vida na batalha.
Pontes: vimos em alguns locais identificar a ponte de Foz de Arouce como a da batalha, mas está descrito que os franceses fizeram explodir a ponte para retardar o avanço das tropas inglesas.
- de Foz de Arouce: é das mais antigas da região.
- Velha: de origem medieval em Serpins.
Núcleo de Gastronomia e Doçaria Regional (Lagar Mirita Sales): pretender preservar as tradições da produção do azeite. Foi recuperado em 2000 e pode ser visitado sob marcação.
Aldeias de Xisto:
- Chiqueiro
- Casal Novo
- Talasnal
- Cerdeira e
- Candal
Onde comer
O Burgo: o restaurante imperdível que demorámos a conseguir reservar. Até na Feira do Livro tínhamos ouvido na mesa ao lado confessar que era o melhor restaurante do país, mas com muita procura. Fica na praia fluvial Nossa Senhora da Piedade, junto à Capela. Reservem com bastante antecedência. Peçam menu de degustação, não se vão arrepender. São pratos tradicionais super bem confeccionados. Provavelmente o melhor local para estacionar é junto ao castelo, nós estacionámos, mas bloquearam-nos a passagem com outro carro estacionado.
À Terra: o restaurante do hotel do Grupo Octant. O serviço foi cuidado, e servem pratos típicos. Recomendamos se ficarem hospedados.
Villa Lausada: é preciso reservar e foi por arriscarmos que não conseguimos ir lá jantar.
Mina: abriu já depois de publicarmos o artigo. É um bar que combina espetáculos com arte e cultura. O nome vem da mina de água encontrada na cave. Servem petiscos e cocktails.
Iguarias
Talasnicos: nascidos na aldeia do Talasnal levam mel e castanha e mais uns quantos ingredientes.
Broa de Serpins: é feita como manda a tradição e tem-se tornado famosa, havendo uma semana de promoção da broa.
Licor Beirão: a fábrica fica às portas da vila. Sabem a história? De medicamento para curar maleitas passou a bebida espirituosa. Nasceu pelas mãos da família Carranca Redondo e sempre foi conhecido pelos seus slogans atípicos, “o Beirão que todos gostam” do tempo de Salazar, “o licor de Portugal”, os anúncios do “que é que se bebe aqui?” e uma página de Instagram que não perde pitada de polémicas para as puxar para si. Se tivessemos que descrever o que torna o beirão tão especial talvez seja a sua portugalidade.
Onde ficar
Há muita oferta, deste hotéis a casas nas aldeias do Xisto. Já viemos à Lousã várias vezes e nunca ficámos, porque há facilidade em chegar a partir de Aveiro. Desta vez quisemos ficar para aproveitar a estadia numa cadeia que sabemos que tem muita qualidade.
Octant Lousã: o Palácio da Lousã foi o primeiro boutique hotel do país, com 46 quartos. A história do edifício é mais do que o mito urbano Masséna/Wellington, começando com a sua construção. Enquanto hotel mantém o aspecto palaciano original com uma escadaria nobre. Não conseguimos utilizar a piscina exterior. A interior, na nossa opinião tem uma capacidade pequena (8 espreguiçadeiras). O pequeno almoço é típico do grupo, espetacular. E continuam a manter a impecável recepção de crianças. Tivemos o azar da atividade do dia ter sido cancelada, mas há várias. Uns dias antes da data de check-in recebem uma comunicação com as ementas do hotel e o calendário de atividades. Podem alugar bicicletas para dar um passeio. Podem ler a nossa experiência no Octant Furnas, que adorámos.
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6 Responses
Nunca tinha ouvido falar desse lugar em Portugal. Achei bem bacana e interesse. Fiquei com vontade de provar o licor kkk
É muito giro, e as aldeias de xisto são super pitorescas.
Com certeza essa história da invasão do Palácio de Lousã tem um floreado – esses episódios sempre são recontados de maneira mais criativa, favorecendo especialmente o lado vitorioso rsrs Mas além das histórias todas, que lugar lindo! Combinação incrível de edifícios históricos com belezas naturais, adorei.
De certeza, parece demasiado para ser verdade.
Nunca tinha ouvido falar de Lousã em Portugal e fiquei curiosa para conhecer. O Centro Histórico parece ser impressionante!
As praias fluviais e as aldeias de xisto são imperdíveis também.