Nunca passámos muito tempo nesta cidade, apenas em escalas. Confessamos que apesar de a acharmos charmosa ainda não nos puxou para lá irmos numa viagem de vários dias. Da primeira vez fizemos escala no regresso da viagem da Turquia, aproveitámos para andar a pé e fazer um cruzeiro pelos canais e ignorámos os museus. Da segunda vez foi a nossa escala a caminho da Islândia e a proximidade do aeroporto à cidade permitiu ir ao centro da capital por umas horas. Chovia torrencialmente o que nos reduziu o programa, só conseguimos ir ao museu de Anne Frank.
Uma das imagens de marca da cidade é Annelies Marie Frank. Uma adolescente de 13 anos que escreve num diário as suas emoções, próprias da idade de quem vive nos anos 40. Até que a sua vida muda. A Alemanha nazi invade os Países Baixos, Anne deixa de ser uma adolescente de 13 anos e passa a ser uma judia em modo de sobrevivência.
Quem não leu o diário de Anne Frank? Aliás, quem não conhece a história? O Tiago não leu, mas foi a introdução da Raquel ao período nazi. Os pais ofereceram-lhe o livro e foi assim que soube mais sobre um dos períodos negros da história da humanidade. O pequeno caderno vermelho e branco descreve a chegada dos alemães e de como a vida mudou. Foi isto que tornou Anne Frank famosa, uma jovem adolescente que conta o que se passa à sua volta com a normalidade de misturar uma paixoneta ou uma grande discussão com a mãe com a segregação de que os judeus eram alvo.
Anne Frank seria uma adolescente como outra qualquer, vivia num bairro normal com a sua família, o pai Otto, a mãe Edith e a irmã Margot. Tinha os seus sonhos, ia à escola, mas… a sua família era judia. Isso não devia representar nenhum problema, e durante muito tempo não representou. Até que começaram a ser perseguidos. Otto tinha chegado a Amesterdão primeiro, depois de terem abandonado a Alemanha em 1933 pelas manifestações antissemitas. Tinha um negócio de sucesso, as suas filhas eram alunas dedicadas, mas quando os nazis chegam as meninas são encaminhadas para escolas judias e as empresas de judeus confiscadas. Otto passa os seus negócios para alguém de confiança e passa a receber uma renda. Começa a ser muito difícil viver com as novas regras e passam a ser olhados de forma diferente e a poder confiar em muito poucos, criam um plano. A família abandonou a sua casa, em Rivierenbuurt, e escondeu-se num espaço pequeno, onde conseguiu sobreviver durante dois anos até à sua presença ter sido denunciada e terem sido encaminhados para os campos de concentração, a 4 de agosto de 1944. Nunca souberam quem os denunciou, até porque ajudar judeus era crime e em muitas famílias havia denunciantes.
Amesterdão permite fazer um roteiro da sua vida. Parte deste roteiro é mega turístico e parte é um ilustre desconhecido que exige pesquisa para lá chegar.
A livraria de onde vem o diário
O pai, Otto Frank, o único sobrevivente da tragédia e o responsável pela publicação do diário da filha, Anne, compra um caderno para lhe oferecer no 13° aniversário. No dia 11 de junho de 1942, o pai compra o diário na livraria Jimmink. A livraria é visitável e não é de todo um destino turístico. Boekhandel Jimmink fica em Rooseveltlaan 62 no sul de Amesterdão.
Anne Frank começa por escrever como espera vir a confiar tudo naquele caderno. Quando um mês depois (6 de julho) precisam de se esconder, o diário começa a ter mais páginas escritas. Ali ficam registados os problemas com a mãe, o interesse em Peter e a descoberta da sua sexualidade. Na Praça Merwede, onde fica a livraria está a estátua de Anne Frank, como homenagem a todos os judeus mortos durante o holocausto.
A casa onde vivia
Anne Frank vivia numa casa normal com os pais, essa casa foi restaurada à época, e não está aberta ao público. É duma fundação particular que dá abrigo a escritores perseguidos. Fica no número 37 (segundo andar) da praça Merwede. Em frente ao prédio estão as placas com o nome da família.
O esconderijo (achterhuis, anexo secreto)
O Museu de Anne Frank, conhecido como a casa de Anne é o esconderijo onde viveram durante dois anos. A família criou um espaço pequeno, secreto e habitável nas traseiras da empresa do pai, Opekta Works. O anexo secreto fica na Prinsengracht, número 263, junto aos canais.
O achterhuis tinha 3 andares, dois quartos pequenos, duas salas e um WC. A entrada ficava escondida por uma estante. Alguns funcionários de Otto foram essenciais para a sobrevivência da família e para que eles não tivessem que sair do esconderijo. O espaço escondeu 8 pessoas. É um local muito procurado pelos turistas. Convém comprar bilhetes com antecedência pelo página do museu Anne Frank. Custa 16€. Não é possível tirar fotos.
O museu inclui áudio-guia, em português a voz de Anne tem um ligeiro sotaque estrangeiro. É ela que lê pequenos trechos do diário que fazem parte da sala que estamos a visitar. Há vídeos do pai e de alguns sobreviventes, onde contam como criaram o esconderijo, como se alimentavam. Uma das partes duras é ouvir Otto partilhar como foi saber que era o único sobrevivente. Outros sobreviventes foram partilhando com ele a morte da sua família. Edith, Margot e Anne sofreram bastante até morrer. E existirá sempre aquela dor de terem partido poucas semanas antes da libertação.
Um dia esta guerra terrível terminará. Chegará à altura em que seremos novamente pessoas, e não apenas judeus
Anne Frank
Através duma denúncia, a Gestapo descobre os 8 moradores clandestinos a 4 de agosto de 1944. Miep Gies, funcionária de Otto e uma das responsáveis pela sua sobrevivência durante esses dois anos no anexo secreto guarda o caderninho de Anne, com a esperança de um dia lho devolver.
Nos campos de concentração
Era normal separar famílias inteiras quando as encaminhavam para os campos de concentração. Menores de 15 anos e quem aparentasse não ser bom trabalhador eram logo enviado para as câmaras de gás. Ninguém sabia muito bem o que acontecia às pessoas, mas sempre se suspeitou que os desaparecidos eram assassinados.
Em 1942 os alemães tomam Westerbork, junto à fronteira e transformam-no num campo de trânsito a caminho dos campos de concentração alemães e polacos. A 8 de agosto de 1944 os Frank e companheiro de casa são enviados para Westerborg e um mês depois enfiados num comboio para Auschwitz. Anne tinha feito 15 há três meses e permaneceu junto da irmã e da mãe durante algum tempo. Durante o período nos campos de concentração cruzaram-se com vizinhas e colegas de escola que mais tarde contaram parte do sofrimento da família Frank. A mãe morreu de fome em Auschwitz (Polónia) e as filhas de tifo em Bergen-Belsen (Alemanha), todas pouco tempo antes da libertação dos campos.
Da família só o pai sobreviveu, e é através dele que nos chega o diário, inicialmente em versão editada e com as identidades dos companheiros de esconderijo protegidas e algumas secções omitidas. Otto chega em junho de 1945 a casa da família Gies e tal como quando decidiram ajudar a família Frank a esconder-se no anexo secreto, voltam a dar-lhe a mão. Miep entrega o diário de Anne ao pai, quando tem a certeza que a jovem morreu no campo de concentração.
Otto passou o resto da sua vida a proteger a memória e legado de Anne, primeiro ao divulgar o seu trabalho e depois ao provar a veracidade do diário, tantas vezes contestado e declarado como falso. Mais tarde o diário foi publicado na sua versão original.
Nota: Peter, primeiro namorado de Anne, e mais um dos moradores do anexo secreto morreu 5 dias da libertação do campo de concentração onde estava, Mauthausen, aos 18 anos.
Este artigo pode conter links afiliados
2 Responses
Acho a história de Anne Frank tão comovente – tanto dos anos no esconderijo, retratando os horrores da guerra, quanto o fato do pai ter sobrevivido e divulgado seu diário. Uma história que não podemos esquecer! Sou muito curiosa para conhecer os lugares que fizeram parte da curta vida de Anne Frank.
A história de Anne Frank e sua família é muito triste. O passeio na Casa de Anne Frank é imperdível em Amsterdã. Porque não podemos esquecer o que aconteceu e repetir os erros do passado. Adorei o artigo!