Porquê falar da influência portuguesa no Ceilão? Tal como já referimos noutros artigos sobre o Sri Lanka, os portugueses deixaram uma forte marca na ilha. Nem tudo foi bom, pelo contrário, como a tentativa forçada de colonizar toda a ilha espalhando a fé cristã à força, mas há coisas que ainda hoje definem o país: arte (música, dança, arquitetura, renda), gastronomia (pão, malaguetas) e a língua (o crioulo, as palavras e sobrenomes que ainda hoje existem).
Arquitetura
Escassa arquitetura portuguesa ainda permanece, cingindo-se às igrejas católicas (São Lourenço em Colombo e São Francisco Xavier em Jaffna) e ao forte de Galle, incluindo algumas das suas casas caiadas. Este centro histórico é reconhecido pela UNESCO desde 1988, considerando a cidade fortificada de Galle como o melhor exemplo da arquitetura europeia na Ásia. Este forte remonta ao século XVI, e era bastante simplório, feito de barro e paliçada. Os holandeses, quando tomaram para si a ilha, adaptaram-no à realidade da época, tal como fariam posteriormente em Colombo.
Podem ler o património colonial em Galle no artigo da Inês no blogue Sempre entre viagens.
Os fortes de Colombo e Jaffna foram muito destruídos e modificados pelos holandeses, no entanto ainda permanecem alguns elementos de origem portuguesa.
Língua
Há vários sobrenomes de influência portuguesa no antigo Ceilão, incluindo a empresa Ebert SILVA. Os mais comuns são: Corea (Correia), Croos (Cruz), De Abrew (Abreu), De Alwis (Alves), De Mel (Melo), De Silva (Da Silva), De Soysa Ou De Zoysa, Dias, De Fonseka Ou Fonseka (Fonseca), Gomes Ou Gomis, Mendis (Mendes), Perera (Pereira), Salgado e Vaas (Vaz).
Há um dialeto crioulo falado pela comunidade burgher que infelizmente se vai perdendo, mas que ainda se fala em pequenas regiões, tendo origem no português. Achamos fascinante que o português tenha sido uma das línguas mais importantes do país e que tenha levado três séculos até que os ingleses tenham conseguido impor o inglês, havendo hoje pouco mais de algumas centenas de falantes do crioulo português. Holandeses e britânicos tiveram que aprender a língua crioula para comunicar na ilha. Mesmo conseguindo impor as suas língua no dia-a-dia administrativo e em documentos escritos, não conseguiam abafar o crioulo nas suas casas.
Existem também várias palavras de origem portuguesa no vocabulário cingalês e tâmil, como mesa, sapato e janela.
Música
Até na música existe influência portuguesa na ilha em forma de lágrima, desde o tempo que se chama Ceilão. Existe a kaffrinha, anterior à baila e de influência africana. Se contextualizarmos à época é fácil perceber que as ondas migratórias de cada um dos países colonizadores foi feita não só com europeus, mas também com africanos. É um estilo musical com forte influência nos escravos trazidos pelos portugueses no século XVI. Os africanos eram as amas, os construtores, as cozinheiras, os jardineiros, e todos os outros trabalhos braçais. Isto remete para uma comunidade relativamente grande e também influenciada pelo ocidente. Criaram-se assim duas comunidades que persistem até hoje, os euro-cingaleses (burghers ou burgueses) e os afro-cingaleses (kaffirs).
A baila é uma dança animada habitual em celebrações como casamentos, com letras que misturam cingalês, tâmil e português. É relativamente recente mas com raízes profundas que nos levam até aos portugueses e à kaffrinha. É muito conhecida entre os católicos de Goa e os Burghers cingaleses. Tem bastante influência não só no ocidente, mas também em África.
Gastronomia
A gastronomia também tem influência portuguesa, de onde trouxemos o pão e as malaguetas. Tentaram mostrar-nos uma salada portuguesa, mas já foi um prato que se foi perdendo (ou ganhando outras influências com o tempo). Atualmente o Sri Lanka tem muita influência indiana na gastronomia. Nós assistimos a um showcooking de 3 pratos no Ekho Safari Tissa, mas também podem fazer uma aula de culinária em Ella.
Podem ler o nosso artigo com a receita de caril de camarão.
Trabalhos manuais
Vimos também fazer renda de bilros, uma tradição que também em Portugal já não tem muitos praticantes. A origem no Sri Lanka é do tempo da ocupação portuguesa e é chamada de beelaru. Em Portugal é uma arte comum em Peniche e Vila do Conde, estando documentada desde 1700. Em Peniche e em Vila do Conde existem escolas e museus de rendas, como o Museu da Renda de Bilros de Peniche. A origem talvez seja dos Flandres, mas dizem que as mulheres já tinham perícia com as redes de pesca e facilmente passaram das redes para as rendas com fio de algodão. Era uma prática feita à porta de casa e é lindo de se ver. Os bilros ficam pendurados nos fios e o pique (desenho) é preso por alfinetes colocados nos buracos. À medida que a rendilheira avança na técnica move os alfinetes. Pode parecer uma técnica complexa, e acreditamos que seja, mas a rendilheira só trabalha com quatro bilros de cada vez.
Também se diz que as técnicas portuguesas influenciaram a ourivesaria cingalesa, particularmente no fabrico de joias em ouro e prata.
Religião
Um ponto onde Portugal pode ter vergonha e o povo cingalês ressentimento é na forma forçada como quis espalhar o catolicismo. Os portugueses iam destruindo templos e construindo igrejas e fortes. Converteram reis ao catolicismo e espalharam a “fé cristã” pelo país. É uma das marcas mais fortes que fica deste período, visto ser ainda uma religião relevante no país, especialmente em cidades como Negombo, conhecida como “Pequena Roma” por ter dois terços da sua população cristã. Além disto, ainda se celebram algumas festas religiosas católicas, como o festival de São Pedro e a celebração de Nossa Senhora. Estes ocorrem em várias vilas pesqueiras católicas, preservando tradições portuguesas.
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365 dias no mundo estiveram no Sri Lanka de 29 de outubro a 7 de novembro de 2024 a convite do Turismo do Sri Lanka, com apoio da Iati Seguros e Sony Portugal
6 Responses
É sempre interessante reconhecer as influências presentes nos países colonizados pela Europa. Impressionante como Portugal foi importante e espalhou sua marca pelo mundo, em países tão distantes como o Brasil e o Sri Lanka.
É incrível o percurso que Portugal, tão pequeno, conseguiu um dia fazer. Sabemos que nem sempre foi da maneira mais correcta, mas hoje é impressionante perceber que as naus portuguesas navegaram meio mundo.
Que interessante a história de Portugal no Sri Lanka. Estou viajando pelo Sudeste Asiático e também vejo muita influência por aqui!
Sim, Portugal graças à rota de especiarias passou em muitos locais pela Ásia.
Não sabia da influência de Portugal no Sri Lanka, me lembrou quando estive em Macau, eu via as placas em Português e achava muito estranho rs.
Que giro. Portugal deixou a sua influencia em sítios bastante longe.